Ana de Hollanda volta com um belo disco depois de doze anos sem gravar

A carreira de Ana de Hollanda acontece sempre discreta e correndo por fora da raia, em termos de gravadora. Ela lançou há poucos dias o quinto disco, mais um por uma gravadora nanica, a Biscoito Fino (nanica, porém sinônimo de qualidade). Os demais álbuns têm selo da Eldorado (Ana de Hollanda, 1980), Movieplay (Tão Simples, 1995), Jam Music (Um Filme, 2001), e CPC – UMES (Só na Canção, 2009). Os hiatos entre si vão de quinze anos, entre o primeiro e o segundo, a oito anos, entre o terceiro e o quarto.

O quinto chega às lojas e plataformas digitais num longo intervalo de doze anos desde o disco anterior. Ana que exerceu e exerce várias atividades ligadas à cultura, entrou em cena depois das irmãs Miúcha e Cristina. Até o segundo álbum gravou como intérprete. A partir de Um Filme, bota de fora as unhas de autoras com uma trinca de faixas autorais. A música título é parceria com Jards Macalé, depois enceta mais uma parceria com Kléber Costa (Contra Mim), no entanto, a melhor autoral é assinada apenas por ela, Girando Sobre a Tempestade, uma das melhores canções do álbum. Ressaltando, das irmãs, e do irmão, Ana é que tem timbre de voz menos anasalado, e mais intimista, embora tenha um fio de voz, é mais cantora do que intérprete, mais intimista do que de arroubos vocais. No disco seguinte, com exceção de Estrada da Vida (Camino de La Vida, José Rico/M. Cedras), o hit da dupla sertaneja Milionário e Zé Rico, as demais faixas são assinadas por Ana de Hollanda e com luminares feito Novelli, Helvius Vilela, Macalé, Nivaldo Ornelas, ou Lucina.

Em sua estreia pela Biscoito Fino, a ex-ministra da Cultura do governo Dilma Roussef, reúne composições compostas nos últimos dez anos com cobras criadas da MPB, Nivaldo Ornelas, Lula Barbosa, Nilson Chaves, Marcelo Menezes, Cristovão Bastos, Leandro Braga, Lucina, Simone Guimarães, numa única faixa, Sem Fim, assina letra e música. Em 2009, ao resenhar o álbum Só na Canção, comentei que, mesmo compondo com autores de estilos tão diferentes, o repertório soava como se fosse de um mesmo autor.

Repete-se isto aqui, com canções a maioria lenta, embora abra com um bolero cubano, Verão que Ficou, e tenha um samba celebrando Dona Ivone Lara, Primeira Dama (com Leandro Braga). Estas, assim como as demais, de letras esmeradas, de interessantes achados, com melodias idem.  Na romântica O Que Deixei Cair (com Nilson Chaves), os belos versos, de uma separação “Quando foi que sua mão se soltou de mim/como pude ser tão distraída?”. Ana, no texto de divulgação do álbum, ressalta em afirmar que não é poeta. Porém é uma letrista primorosa, nisso aproxima-se do irmão. De procurar pela palavra certa para os versos exatos, como em Jamais: “Eu vivi/penso que vivi/não sei mais lembrar/como você se enevoou/me deixou/me abandonou/amarrou promessas/e partiu como chegou”, de Jamais Decifrei (com Leandro Braga). O  disco termina com Vivemos, assinada apenas por Ana, a de letra mais confessional: “Vivemos um amor além da lei/além do fim”.

Ana de Hollanda não poderia estar mais bem acompanhada: piano e arranjos de Cristóvão Bastos, violão, violas e guitarra de João Lyra e percussão de Zé Leal. As interpretações que nunca sobem o tom, o piano que emoldura todo o repertório, imprimem ao disco um clima de noturnos de Chopin.  

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